Com quarenta e um anos completinhos e cheia de vida e disposição, me vi cansada e estranha. O corpo doía, mas não era aquela dor de malhação, nem de joelho ralado, sei lá, era uma dor no meio do corpo.
Na manhã de terça-feira, 2 de junho de 2020, acordei por volta das 7h da manhã, como de costume. Desci as escadas para tomar café e comentei com a filha: ai, estou com dor no corpo! Ela terminando o seu café falou: ihhhh. E saiu, dizendo que vinha para o almoço!
Como todos os dias, desta quarentena que começou em março, eu fico em casa pela manhã, tiro a mesa do café, lavo louça, molho as plantas e a horta (fruto da união em dias dentro de casa), ponho roupa na máquina pra lavar, auxilio a outra filha com as teleaulas ou com as falhas diárias de conexão com internet, adianto algo para o almoço…mas no meu primeiro dia de 4.1 me senti cansada ainda por volta das 9h da manhã. Então pensei: vou voltar pra cama.
Deitei com dores nas costas, costelas, cabeça…ali permaneci a manhã toda. Incomodada, estranha, fraca, encolhida e sem vontade de sair dali.
Veio a hora do almoço, a filha chegou e já me viu jogada na cama. Logo colocou a mão pra saber se tinha febre. Pegou o termômetro e a temperatura corporal estava na casa dos 35 graus. Normal.
Almoçamos a sobra do dia anterior, elas organizaram a cozinha, e eu, antes disso deitei novamente.
À noite, o marido chegou e pedimos uma comida especial, ainda em comemoração ao aniversário. Fui comer porque já havia combinado com todos esse “evento” em época de isolamento, mas a vontade era de ficar na cama porque as dores estavam por toda parte.
O sono foi interrompido várias vezes com os incômodos causados pelas dores e cansaço.
Na quarta-feira, o quarto era o meu universo. Conectada com o mundo pela TV e celular, que não para um segundo. Porque o teletrabalho vai além da carga horária de registro em carteira, né?! Mas, mesmo com o desconforto, saber que é possível ser útil até nestes momentos serve de consolo.
Tomei um remédio pra dor, mas o alívio foi só mesmo durante o efeito da medicação.
Meu encontro com o restante da minha casa era somente durante as refeições. E logo chegava mais uma noite para esperançar e acreditar que no dia seguinte estaria melhor.
E naquela noite também acordei com os incômodos e tentei dormir novamente depois de me arrastar no escuro até o banheiro.
Na sexta-feira, com um dia mais fresco do que o habitual na Amazônia, o café da manhã já não desceu, aliás, nem foi para a xícara. E o subir as escadas até o quarto era o principal desafio. A filha, que neste dia não saiu pela manhã monitorou a temperatura, oxigênio no sangue, pressão arterial e passou um relaxante muscular, que estava na caixa de pesca do pai.
No jantar comentei com a família que estava com aquela sensação de surdez quando estamos descendo a serra e todos riram, porque já sou meio surda.
O sono foi mais tranquilo porque as dores na região das costelas deram uma trégua.
Sábado ensolarado e o leite com café foi o que consegui por na boca. Mas aí, diante do quadro que não melhora e todas as evidências de sintomas, resolvemos, sim porque é quase uma junta médica aqui em casa, procurar por auxílio profissional. Bom, justamente no dia em que o isolamento social voltou a ser restritivo e o número de vagas nos hospitais rondonienses estava perto de zero. Mandei mensagem para uma vizinha médica que trabalha no Call Center instalado para orientar sobre Covid-19. Relatei os últimos acontecimentos e ela fez várias perguntas e escreveu: “A princípio sua evolução tem tudo para ser leve e autolimitada. É mulher e não é do grupo de risco.”
E continuou informando que a orientação é para entrar já com uso de medicação. Até fazer o exame em laboratório particular na segunda-feira, porque na nossa cidade não tem voos no fim de semana e as amostras não podem ser levadas para análise em outros estados nos sábados e domingos. Mas por que não fazer exame no sistema público de saúde?! Por conta da lotação que já comentei acima!
Então começa a corrida pela tal medicação polêmica e ainda empírica para casos suspeitos de COVID-19.
Ah! Um medicamento já está em falta nas farmácias daqui. Mas ele já era usado aqui em casa, aliás bastante conhecido por aqui, e é para pessoas da cidade quando vão à área rural, ou seja, piá de prédio na roça! Uma espécie de “repelente” para bichos minúsculo que gostam das partes mais quentes do corpo. Uma beleza para evitar coceiras!
Brincadeiras à parte, sim, não tem pra comprar o tal medicamento da linha dos vermífugos que é associado a outros tipos como antibiótico e vitaminas.
Para comprar tudo foi preciso pegar receita com outra médica conhecida para prescrição de antibiótico.
Mas aí antes de começar o coquetel detectei outros sintomas como falta de olfato e paladar. Além de espirros e tosse.
Em conversa com outra médica, quase irmã, ela falou que são muitas as evidências para a tal Covid e precisaria entrar com outras medicações também, como se estivesse internada em um hospital. Minha filha, que é interna de Medicina, foi até a casa de um médico, o quarto desta história e também conhecido da família para receber as devidas orientações e começar o tratamento.
Injeções, mais comprimidos, inalação, fisioterapia do pulmão…
Começamos a batalha!
Declarada a guerra contra o invisível aos olhos!
Nesta fase todos da casa, meio assustados com tudo isso, nem entraram mais no quarto! Que virou copa, porque colocaram mesa e cadeira para as refeições que passaram a ser feitas ali mesmo. Comidas preparadas pelo marido que é expert na cozinha mas que eu não sabia mais se eram doces ou salgadas? Amargas ou azedas? Sumiu tudo! Nada de cheiro e nem gosto de nada…nem da pasta de dente e enxaguante bucal!
Apenas a filha mais velha entrava toda paramentada para fazer a medicação, levar comida, fazer a limpeza.
O marido passou essa noite no sofá da sala e a filha mais nova fez companhia na poltrona ao lado.
O isolamento, distanciamento, Lockdown são reais por aqui.
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